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SÍNDROME DE POLINIZAÇÃO NO CERRADO

(Publicado no URTIGA 156 - maio/junho 2003 - pags. centrais)

 



Ou..., como os polinizadores promovem o casamento das flores (e truques das flores, para chamar estes casamenteiros). Confira!

Andrea Costa Marques - foto Silvia Czapski

ARMADILHA DA NATUREZA

CIÊNCIA E CERRADO

CHEGANDO AO CERRADO DE ITU

IMPORTÂNCIA DOS INSETOS

ESPECIAL:

DEZ FLORES INTERESSANTES DO CERRADO ITUANO

 

 

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vista do cerrado = foto Silvia CzapskiAristolochia é uma planta trepadeira, existente no cerrado ituano. Suas flores, de cor escura e arredondadas, têm cheiro bem repulsivo para as pessoas. Mas as moscas gostam tanto, que buscam a flor. Esta, por sua vez, abre-se para o inseto, permitindo-lhe entrar em seu interior. Só que, logo em seguida, a flor se fecha, prendendo a mosca dentro de si.

O inseto debate-se muito, a ponto do pólen grudar em seu corpo. Quando a flor se abre, a mosca sai. Mas - como o odor continua irresistível -, lá vai ela buscar a armadilha de outra aristolochia, levando para a ouesquema das florestra flor o pólen da primeira.

É assim que acontece a polinização desta espécie, permitindo o cruzamento entre duas aristolochias ou, na linguagem dos cientistas, que o pólen (elemento masculino) de uma flor alcance o estigma (elemento feminino) de outra, possibilitando a fertilização do óvulo, o que leva à formação do fruto, primeiro passo da multiplicação da espécie na natureza para a maior parte das plantas.

Cientistas chamam de sapromiiofilia este tipo especial de polinização que envolve moscas e flores-armadilha. Em geral, são flores escuras e mal-cheirosas, comenta Andréa da Costa Marques Tavares, bióloga que está completando licenciatura na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e ganhou bolsa de estudo de um ano para pesquisar síndromes de polinização no cerrado ituano.

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O QUE É, O QUE É

Arvore florida - foto Andrea MarquesSíndrome, resume Andréa, nada mais é de que um conjunto de características. Ou seja, nesta pesquisa, ela está observando as características da flores de diferentes espécies de plantas do cerrado. Através disso, dá para concluir quem são os agentes polinizadores da espécie (como a mosca, no caso da aristolochia).

Na verdade, ressalta a bióloga, existe uma enorme variedade de agentes polinizadores, na natureza. Ela enumera alguns dos nomes científicos para diferentes grupos de polinizadores.

Começando pela polinização facilitada por elementos físicos. Anemofilia, diz ela, é a polinização gerada pelo o vento, que pode carregar consigo o pólen, de uma flor para outra. Outro caso, mais raro, é a hidrofilia, polinização realizada pela água.

Uma enorme variedade de animais poliniza espécies específicas de flores, prossegue Andréa. Melitofilia, exemplifica, é a polinização feita por abelhas, vespas e formigas, que preferem flores de cores vistosas (exceto as vespas), com perfume (como as rosas), nas quais possam pousar.

Quiropterofilia é a polinização que morcegos realizam, sempre no período noturno, beneficiando flores como a de alguns cactus, que só abrem à noite. Há muitos outros, inclusive mamíferos não voadores que polinizam flores. (clique aqui, para ver um quadro com mais espécies / flores para atraí-las).


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CIÊNCIA E CERRADO

A bióloga explica o papel da polinização na defesa do meio ambiente. Às vezes, diz, a co-evolução da planta e de seu polinizador ocorreu tão intimamente, que essa espécie de planta é polinizada exclusivamente por determinada espécie animal. Então, se o animal desaparecer do ecossistema, a planta correrá risco de extinção, por não conseguir se reproduzir.

Em outras palavras, o estudo da polinização (o que inclui a identificação dos agentes polinizadores) tornou-se elemento importante para a proteção ambiental. "Um dado a pesquisar, quando se quer saber se uma espécie vai bem no ecossistema, é a presença de seu polinizador".

Ela historia: a descoberta do pólen tem mais de 3.000 anos. Foram os babilônios que notaram que o pó amarelo presente nas flores da tamareira (Phoenix dactylifera, Arecaceae) quando aplicado nas flores de outras árvores da mesma espécie, geravam mais frutos.

De lá para cá, em especial nos últimos 200 anos, o estudo das flores diversificou-se em muitos ramos, envolvendo desde a anatomia, até sistemas de cruzamento, genética e paleobotânica (pesquisa das plantas fossilizadas, para conhecer os diferentes períodos arqueológicos).

Polinização, prossegue Andréa, faz parte deste contexto. Só que, no Brasil, a maior parte dos estudos nesta área concentra-se em grupos isolados de animais ou plantas. Ou seja, pesquisa-se uma espécie de planta, buscando identificar todos seus polinizadores. Ou então, estuda-se uma espécie animal (digamos, abelha-jataí), para observar quais as flores visita, durante cada época do ano e nos diferentes horários do dia.

"Poucos trabalhos englobam um bioma, como o Cerrado, checando o conjunto de polinizadores, pelas plantas e respectivas flores, bem como seus visitantes".



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CHEGANDO AO CERRADO



A bióloga confessa que, quando entrou na faculdade, sonhava em realizar pesquisas na exuberante Mata Atlântica. "A maior parte das pessoas, quando pensa em floresta, visualiza as formas mais exuberantes. Só que, quando comecei a visitar o Cerrado, com sua vegetação bem mais baixa, tive oportunidade de reparar em seus detalhes, principalmente a variedade e beleza das flores. Apaixonei-me por este bioma".

Com o apoio institucional da AIPA, ela elaborou seu projeto, que foi aprovado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia) e ganhou bolsa de iniciação científica, através da Unicamp.

Usando como base de apoio a sede da AIPA em Itu, desde 2002, Andréa visita semanalmente a área de cerrado vizinha a este local, para observar as flores e seus visitantes polinizadores (ou aqueles que fazem a pilhagem do néctar, picando a pétala da planta para extraí-lo, sem tocar no pólen).

Como num trabalho de detetive, a bióloga espera a floração das plantas, gastando horas de observação a partir disso. Além de observar eventuais visitantes/ polinizadores, anota todos os detalhes: forma, cores, tamanho de cada parte da flor, disposição destes componentes, época e duração da floração, perfume que exala. "São elementos importantes, para prever quem podem ser os polinizadores."

Quando quer checar dados, como identificação de espécies de plantas e seus visitantes, Andréa busca apoio Herbário e do Museu de História Natural da Unicamp, além de especialistas do curso de Biologia. Uma bibliografia que lhe serviu de referência foi ao Estudo de Flora e Fauna realizado em 1987/8 pela SPVS (Sociedade de Proteção da Vida Silvestre), com apoio da AIPA, na mesma área hoje avaliada por ela.


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IMPORTÂNCIA DOS INSETOS

tente enxergar o inseto nesta pequena flor de cerrado
(foto:silvia Czapski
)

Nos primeiros seis meses de observação de campo, Andréa já confirmou: a maior parte das espécies observadas no cerrado ituano tem nos insetos seus principais agentes polinizadores.

A época de mais flores é a que precede o tempo de chuvas: de (julho a setembro). Mas também no verão ela observou um bom número de flores. O néctar é o recurso que atrai mais agentes.

Até junho de 2003, 70 espécies passaram pela avaliação da bióloga. Das síndromes de polinização identificadas, a campeã foi a melitofilia (polinização por abelhas, vespas e formigas, que polinizam cerca de metade das espécies estudadas).

Em segundo lugar veio a miiofilia (polinização por moscas, como no exemplo da aristolochia), seguida e psicofilia (polinização por borboletas). Trata-se de um resultado esperado, afirma a bióloga, lembrando que abelhas podem ter vôos longos, o que é bom no Cerrado, onde as árvores são mais esparsas. As vice-campeãs, moscas, também confirmaram sua importância como polinizadoras nesse ambiente.

Terceiras no ranking, as borboletas polinizam muitas plantas da família das compostas, que têm as flores tubulares reunidas em inflorescências (conjuntos de mini-florzinhas).

Empatadas na última posição, há mais síndromes de polinização, revelando a importância de outras espécies animais, para a multiplicação das espécies: cantarofilia (polinização por besouros), ornitofilia (aves, em especial beija-flores), falenofilia (polinização por mariposas, em geral trabalhando a partir do por do sol) e quiropterofilia (poucos sabem que há espécies de morcegos especializadas no consumo de néctar).

Formação vegetal muito importante, fonte de grande diversidade de flora e fauna, o Cerrado é objeto de muito menos estudos científicos sobre a biologia reprodutiva de suas comunidades, de que os para florestas tropicais, conclui Andréa.

Quando elaborou seu projeto, ela alertou que o fragmento a estudar apresenta alterações, uma vez que já teve problemas de degradação ambiental. No entanto, os resultados são de um típico cerrado, já raro no território paulista. A experiência e os resultados obtidos, promete, serão fontes para novos estudos, que pretende desenvolver.

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Com explicações de Andréa Marques Tavares, sobre quem são seus polinizadores
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