Atraído pela beleza da represa de Itupararanga, e das florestas nativas
às suas margens, José Benjamin Pesce mudou-se para a região
há três anos, investindo numa marina. Instalada ao lado da barragem,
ela aloja cerca de 120 barcos de até 30 pés, que os donos usam quase
só em feriados ou fins de semana.
Cerca de 30% dos proprietários são de Sorocaba (15 km da represa)
e 40%, de São Paulo (a 130 km). Além desta, há mais duas
marinas, somando algumas centenas de embarcações, também
de pequeno porte, utilizadas com finalidade turística.
Construída pela Light em 1914, a barragem de Itupararanga pertence a uma
usina hidrelétrica, que já foi a 5ª maior do mundo e passou,
mais tarde, para o governo federal. Há 30 anos, o governo cedeu-a para
uso da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), do Grupo Votorantim. Por
isso, a energia hoje extraída das águas de Itupararanga alimenta
apenas a CBA (para lembrar: alumínio é 90% energia e 10% bauxita).
Em 2004, em vez de festa pelos 90 anos de construção da Senhora
Represa, só brigas estão acontecendo. E não é para
menos. Além servir para o lazer e produção de energia, ela
abastece cidades próximas. As torneiras de mais de 80% dos moradores de
Sorocaba, por exemplo, recebem água de Itupararanga.
E - apesar de ser uma Área de Proteção Ambiental - tem crescido
a ocupação humana no entorno da represa. Além de sítios
(alguns antigos), há hoje dois condomínios de luxo na região,
e focos de desmatamento. São fatores que facilitam a erosão do solo
(cujas partículas podem ser levadas para a água), e a poluição.
Neste
verão, o nível da represa baixou como nunca. Chegou a 8 metros abaixo
do nível máximo. Turistas - inclusive os donos das centenas de barcos
- deixaram de vir. Quem mora na região alarmou-se com a possibilidade deste
manancial - antes tido como inesgotável -, secar.
Confessando-se apaixonado por Itupararanga desde criança, Helio Teixeira
Calado Jr. é um dos mais indignados. “Hoje tratam a represa como se fosse
uma caixa d’água que recebe até cinco litros por dia, da qual as
pessoas tiram 15 litros diários, sem se preocupar”, compara. Neste fevereiro,
termina o período de concessão da CBA, para gerar energia com a
água da represa.
Helio Calado raciocina: diante do quadro atual deve-se escolher: abastecer a população
e manter vivo o curso d’água são prioridades, diz, questionando
a renovação provável da concessão.
Representando os moradores do entorno, ele protocolou uma representação
junto ao Ministério Público em 26 de dezembro. Os promotores visitaram
a represa e, já em 31/12, instauraram um inquérito civil. “O problema
é o tempo longo dos inquéritos. Enquanto isso, como ficaremos?”,
pergunta Calado. Notícias
da imprensa regional mostram que, enquanto isso, a CBA e Comitê das bacias
do Rio Sorocaba e Médio Tietê já prepararam um protocolo de
intenções. Objetivos? De um lado, criar um Centro de Referência
em Educação Ambiental. De outro, instalar estações
para medir volume das águas de chuva e dos rios, inclusive formadores da
bacia, para complementar análises de qualidade, feitas pela Cetesb (agência
ambiental paulista). Só parte dos recursos (valor não definido)
viria da CBA: o resto seria garantido pelo Fundo Estadual dos Recursos Hídricos.
Temor dos ambientalistas,
revelado no jornal Cruzeiro do Sul, de Sorocaba: que o protocolo, que é
apenas de intenções, seja confundido com termos de compensação
ambiental obrigatórios por lei, reivindicados por lideranças políticas
locais. Em 1° de fevereiro, uma romaria de barcos na represa, em homenagem
à Nossa Senhora dos Navegantes, apelava pela proteção destas
águas.... É
só mais um caso de conflito, no qual a água limpa parece estar no
lado mais fraco. Como lembrou Washington Novaes, em artigo no Estado de São
Paulo: outro lado da mesma moeda de crise na gestão neste setor é
o desperdício. Hoje, 40% da água captada para abastecimento perde-se
em desvios ou vazamentos da rede pública, antes de chegar ao consumidor.
O uso de pivôs centrais, para irrigar, geram desperdício na agricultura.
E a adoção de equipamentos economizadores, como descargas que usam
menos água, ainda não são obrigatórias.

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