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NÓS E TODA NATUREZA, EM PERIGO

(Publicado no URTIGA 167 - abril/junho 2005- pags. centrais)

 



Os avisos estão visíveis para todos.
O futuro está em nossas mãos,
informa um estudo da ONU
Confira .
SOJA
SERVIÇOS DA NATUREZA
MAIS PERIGOS

 

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DEVASTAÇÃO NA AMAZÔNIA

Ilustração: Dian Storch

Alarmantes, os novos números do desmatamento da Amazônia, anunciados em 18 de maio pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), com base em levanta-mentos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). De agosto de 2003 a agosto de 2004, foram para o chão mais de 26 mil Km2 de floresta, equivalendo a uma área quase do tamanho do estado de Alagoas. É um desmatamento 6,2% maior de que no período anterior (2002-2003), e só menor que o de 1995, quando a derrubada foi calculada em 29 mil km2.

O número permite outra conclusão assustadora: já perdemos quase um sexto (17,3%) da cobertura florestal da Amazônia brasileira. Trata-se de um dos biomas mais ricos em diversidade do mundo, garantem os cientistas. O triste, dizem ambientalistas, é que boa parte desta riqueza jamais será conhecida, já que a destruição da natureza gera a extinção de mui-tas espécies.

Talvez o número seja pior que a informação oficial. Num artigo no jornal O Estado de São Paulo, o articulista Washington Novaes comentou que, antes do anúncio, havia quem mencionasse um desmatamento de 30 mil km2 para o último ano. A questão, diz ele, é que Acre e Roraima não en-traram na contabilidade da devastação neste período. Além disso, não se sabe se consideraram, como desmatadas, as áreas próximas de trechos devastados, mas que estão sob nuvens nas imagens de satélite.

Para Novaes, o título da manchete do jornal The Independent, da Inglaterra, retrata como o mundo entendeu a notícia: O estupro da floresta. No Brasil, os efeitos foram fortes. O Partido Verde abandonou a base de apoio do governo, e representantes do governo federal não souberam explicar o resultado desastroso, depois de garantirem que 13 ministérios estariam juntos com o MMA tanto no combate ao desmatamento, como na inserção da questão ambiental na gestão pública.

Novamente a palavra para Novaes: "Além de seu orçamento ser de me-nos de 1% do orçamento federal, desde o início a posição dos ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento prevaleceu, quando se permitiu, por exemplo, reduzir a proporção de álcool na gasolina brasileiro (aumentando a poluição gerada por veículos em nossas cidades e rodovias), para exportar esse mesmo álcool para o Japão e Suíça, que queriam baixar seu nível interno de poluição do ar."

Há outros exemplos problemáticos, citados pelo analista. Entre eles, a aprovação da Lei da Biossegurança (dos transgênicos), de forma contrária ao que defendia o MMA, e a autorização da transpo-sição do Rio São Francisco pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente, apoiada pela ministra, mas rejeitada por ambientalistas, que defendiam a recuperação deste rio, antes de qualquer outra medida.

 

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SOJA

Voltando ao desmatamento. O maior vilão do ano foi Mato Grosso, que sozinho, desmatou quase metade da área derrubada (12,6 mil km2). Quem governa este estado é Blairo Maggi, atual rei da soja, que também defende a derrubada do cerrado, para plantar grãos. Não faz tempo que jornais noticiaram que não era a expansão da sojicultura, a causa da devastação da Amazônia. Mas estudiosos rebateram a informação. É claro que primeiro derruba-se a floresta, vendendo madeira. Por um período, tem quem faça pastagens no local. Mas a soja é o destino subseqüente de muitas áreas.

"Temos de repensar o modelo brasileiro de expansão da sojicultura", critica Fernando Almeida, presidente-executivo do insuspeito Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), uma organização não-governamental formada por quase 60 empresas de grande porte, como Shell e White Martins. Almeida conta que esteve num congresso cujo tema era soja sustentável. Hoje, diz ele, seu cultivo no Brasil não é sustentável, seja do ponto de vista social ou ambiental. No futuro, isto pode ter graves conseqüências econômicas.

Com os avanços tecnológicos, diz ele, a soja adapta-se a áreas de floresta amazônica, cerrado, Mata Atlântica. Trocam-se ecossistemas nativos por monoculturas deste grão. Para que? A maior parte da soja vira ração animal. E mais: uma tonelada de soja rende apenas 100 quilos de boi (a eficiência energética de 10%). "Quase toda soja é exportada. Chegará um dia, em que os compradores internacionais vão rejeitar o produto, pois o plantio ajudou a destruir a natureza", prevê Almeida

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AVALIAÇÃO ECOSSISTÊMICA

 

Fernando Almeida foi um dos integrantes de uma Comissão Mundial nomeada pela ONU, que acaba de divulgar um amplo relatório intitulado Avaliação Ecossistêmica do Milênio (em inglês, Millenium Assessement), que contou com apoio de 1300 especialistas para ser produzido.

Quais as conseqüências das mudanças já causadas até agora pelo bicho-homem nos ecossistemas do mundo? Como garantir o uso sus-tentável dos recursos naturais e dos serviços da natureza para garantir o bem estar da nossa e das próximas gerações? foram as perguntas que se procurou responder.

As conclusões, assustadoras, revelam que já ultrapassamos o limite da exploração possível da natureza. Em outras palavras, se continuarmos a consumir os recursos naturais (água, energia, alimentos, matérias primas para produtos) no ritmo de hoje, no futuro não haverá o suficiente para a sobrevivência dos seres vivos no Planeta. Para o bem das espécies (inclusiva a humana), avisa o estudo, é urgentíssimo mudarmos o pa-drão de produção e consumo.

Atualmente, informa o relatório, o mundo já sofre algumas conse-qüências da degradação ambiental. Exemplos? Dois bilhões de pessoas vivem em regiões secas, sem acesso à água. As mudanças climáticas (aumento da temperatura média no planeta) em curso, provocam secas, enchentes, ameaçam a saúde pública, e espécies de animais e plantas, podem desaparecer, por não se adaptarem se adaptar aos novos padrões climáticos. Poluição, uso excessivo de recursos naturais são outros males perigosos.

 

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SERVIÇOS DA NATUREZA

A expressão serviços providos pelos ecossistemas, ou simplesmente serviços da natureza, é uma das bases do estudo. Mais fácil explicar com um exemplo. Uma floresta é composta por árvores, que fornecem madeira, energia (lenha), frutos. Mas haveria uma série de serviços que ela presta, em geral não mencionados. Por exemplo, elas protegem os recursos hídricos (fornecimento de água pura). Contribuem para o equilíbrio climático. Servem para o lazer. Enchem nossos olhos pela beleza. Além disso, coberturas vegetais ajudam a prevenir a erosão do solo, reduzindo possibilidades de deslizamentos de terra e outros desastres naturais.

Já existem especialistas que tentam definir um valor financeiro para os serviços da natureza. Não é simples. Que preço dar, por exemplo, para o desequilíbrio ambiental, que facilita o surgimento de doenças humanas e pragas nas lavouras?

Outra questão, lembrada na Avaliação Ecossistêmica, relaciona-se à percepção ambiental. Cada vez mais gente mora em cidades, sentindo-se distante da natureza, entendida como lugar para passear nos fins de semana. Até mesmo nas áreas rurais, proteger ecossistemas nativos parece luxo, algo com menos valor de que usar os terrenos para agricultura extensiva.

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QUANTO SE PERDEU

Nos últimos 60 anos, indica o estudo, mais áreas nativas foram convertidas em lavouras de que nos dois séculos anteriores somados. Hoje, quase um quarto (24%) do planeta é cultivado. Modelo agrícola desde os anos 1960, a chamada Revolução Verde combina monoculturas, com uso de maquinário, agrotóxicos e fertilizantes químicos, que contém nitrogênio e fósforo na composição.

O estudo denuncia que metade do nitrogênio fabricado desde 1913, foi colocada nos solos nos últimos 20 anos. Também a quantia de fósforo quase triplicou entre 1960 e 1990. Quando o nitrogênio é carreado para córregos, rios e até oceanos, gera a multiplicação de plantas aquáticas, como as algas, que por sua vez, sugam o oxigênio da água, matando outras formas de vida aquática. É a eutrofização. Já o fósforo fica por décadas no solo, alterando o equilíbrio ecológico.

Água doce é outra preocupação. Apesar de ser um recurso abundante no mundo, sua distribuição é irregular. O volume de água desviada de rios e lagos para irrigar plantações, abastecer indústrias e casas dobrou, desde 1960. Mesmo assim, a escassez ainda afetaria de 1 a 2 bilhões de pessoas. Pior, pelo estudo da ONU, a água armazenada em reservatórios naturais quadruplicou no período, mas este manejo prejudi-cou os rios. Os famosos Rio Amarelo, na China, e Nilo, no Egito, vão minguando, antes de chegarem ao mar.

Nas áreas costeiras, o turismo e atividades de exploração marinha, como fazendas de camarões, também têm conseqüências negativas. Segundo a a Avaliação Ecossistêmica, nos últimos 20 anos, o Homem teria destruído mais de um terço dos manguezais. São ecossistemas litorâneos, conhecidos como berçários da natureza, pelo número de espécies que vão lá se reproduzir.

Os oceanos são outro exemplo do que acontece quando o Homem tira mais da natureza, de que ela consegue repor. Pela sobrepesca e poluição marinha, pelo menos um quarto dos cardumes marinhos diminuiu a ponto da indústria reduzir suas atividades. No costa do Canadá, já não há bacalhaus. Comunidades pobres perderam a fonte de subsistência.

Hoje, o Homem vai rapidamente de um ponto do planeta para outro. Quando quer, importa e exporta plantas e animais, seja uma vaca leiteira, ou planta exótica. O que não se imaginava, é que milhares de espécies, às vezes microorganismos, cruzam o mundo escondidos por exemplo na água de lastro de navios (que dá peso às embarcações).

O estudo da ONU cita vários desastres ambientais resultantes desta trans-ferência. É o caso de uma espécie de água-viva que, quando se espalhou no Mar Negro, destruiu 26 espécies de peixes com alto valor comercial.

A Avaliação Ecossistêmica conclui que o Homem mudou o ritmo de extinções globais em quase mil vezes, comparado com o que seria a taxa natural de extinção, ao longo da história de nosso planeta.

 

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MAIS PERIGOS

Apesar do aumento da produção de alimentos nas últimas décadas, estima-se que 856 milhões de pessoas estavam subnutridas entre 2000 e 2002, cerca de 32 milhões mais do que entre 1995 e 1997.

Áreas como os 14 países da África Subsaariana estão entre as onde, contrariando tendências mundiais, diminuiu a produção de alimentos por pessoa. Lá ocorre uma das maiores taxa de desnutrição do mundo. Também lá existe um foco de desertificação. Repetindo uma conclusão do estudo da Comissão Brundtland, também nomeada pela ONU nos anos 1980, a Avaliação Ecossistêmica propõe que pobreza e degradação da natureza estão associadas. E que, para ter um meio ambiente sadio, deve-se combater a pobreza.

Mas a lista de sugestões é bem maior. De um lado, o estudo fala em retirar os subsídios à agricultura, pesca e energia, quando estes forem capazes de causar dano às pessoas ou meio ambiente. De outro, propõe compensar aqueles proprietários rurais que manejarem as terras de modo ecológico.

Investir em educação, para que a população saiba como e porquê consumir menos os serviços da natureza, como água, energia, é outra chave para um futuro melhor. Uma das causas do desmatamento em larga escala na Indonésia e Amazônia, diz o estudo, é a demanda por madeira, papel e produtos agrícolas originada longe da área desmatada.

Desenvolvimento de tecnologias limpas, que não agridem a natureza, reduzem o consumo de energia, e até proporcionem a recuperação de ecossistemas degradados, também fazem parte do pacote de propostas. O estudo destaca que alguns avanços aconteceram, neste sentido. Caso contrário, a situação mundial seria muito mais grave. E que este é um caminho da prosperidade empresarial. Gastando menos recursos naturais, a atividade econômica torna-se mais lucrativa.

A mensagem final tem tom otimista. Se os avisos estão visíveis, o futuro está em nossas mãos. Mas todos setores, inclusive governos na definição de regras comerciais, devem se empenhar, para evitar o desastre, que também pode ocorrer.

 


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