URTIGA
EDIÇÕES ANTERIORES
MAIS SOBRE O URTIGA
NOTÍCIAS DA AIPA
DOCUMENTOS COLETIVO CONSEMA

 


A MULTIPLICAÇÃO DAS AVES URBANAS

(Publicado no URTIGA 157 - julho/agosto 2003 - pags. centrais)

 



Ornitólogos relatam que várias espécies estão se adaptando às cidades. Mas isso pode não ser bom sinal.... Confira e aprenda dicas para observar aves

VOCÊ SABIA QUE O SABIÁ...

DO CAMPO PARA A CIDADE

NÃO SE EMPOLGUE!!

INTERIOR TAMBÉM PREJUDICADO

GRANDES NÚMEROS

DICAS - OBSERVANDO AVES
+: publicações, CDs, e um link para saber mais

E MAIS:

O PAPEL DOS OBSERVADORES
e resultados de um levantamento de aves em Itu

 

 

filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa inicio desta página


VOCÊ SABIA QUE O SABIÁ...

Você sabia que o sabiá é uma ave existente em quase todo o mundo? E que existem quase 70 espécies de sabiás identificadas pelos cientistas? Delas, o sabiá-laranjeira é a mais conhecida entre os brasileiros.

Não é à toa. Esta avezinha marrom, de corpo robusto, peito alaranjado, está cada vez mais presente nas áreas urbanas. Com a aproximação da primavera, época de sua reprodução, é comum ouvir seu belo trinado, começando às vezes já na madrugada.

“Nunca ouvi tantos sabiás-laranjeira como nos últimos anos”, repara Luiz Fernando Figueiredo, do Clube de Observadores de Aves da capital paulista (Ceo). Médico sanitarista que começou a estudar ornitologia como hobby, ele comenta que várias espécies, antes raras em áreas urbanas, são cada vez mais vistas nas cidades.

É o caso do periquito verde, típico da Mata Atlântica. Taxado como espécie ameaçada no estado de São Paulo, acabou encontrando um ambiente propício na cidade. “Há coqueiros e palmeiras em praças e jardins, que lhe fornecem alimento, enquanto que, na Mata Atlântica, o palmito, sua principal fonte de sustento, está em extinção.”

Maior de que este periquito, o maracanã (Ara nobilis), que vivia no oeste paulista, foi mais longe na capacidade de adaptação: para a surpresa dos ornitólogos, aprendeu a fazer seu ninho no forro das casas (no campo, ele usa ocos de árvores para este fim). “O professor Faiçal, do Zôo de São Paulo, soltou um grupo no Parque Ecológico do Tietê. Eles se adaptaram tanto à área urbana, que hoje é comum vê-los, em grandes bandos”, conta Figueiredo.

filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa inicio desta página


DO CAMPO PARA A CIDADE

Não são os únicos migrantes que se deram bem na cidade. Falando em abril ao jornalista Luiz Roberto Souza Queiroz, d’O Estado de São Paulo, o ornitólogo Edwin Willis contou que a asa-branca, uma pomba nordestina de 37 centímetros, "bateu asas do sertão e veio pousar em São Paulo, onde chegou em 1970", adaptando-se às nossas áreas desmatadas.

Outra nordestina, a ave lavadeira (Fluvicola nengeta), aproveitou a destruição das matas ciliares (que beiram rios) de São Paulo, estabelecendo-se nas margens destes rios a partir de 1980 e agora, segundo Willis, coloniza o Paraná.

Mais uma espécie citada por Willis é o tucano-açu. “Na capital paulista, ele aparece em áreas arborizadas, como o campus da USP (Universidade de São Paulo)”, complementa Figueiredo que explica: nestes locais, árvores frutíferas proporcionam comida. E cidades têm menos predadores, como cobras ou corujas. Estas aves acabam se acostumando aos seres humanos.

Neste ponto, todos especialistas consultados por Urtiga são unânimes: a mudança de postura do bicho-homem contribuiu para a multiplicação de certas aves nas áreas urbanas. Armas de fogo dos adultos e estilingues dos meninos foram trocados por comedouros e bebedouros, pelo prazer de observar estes belos animais, resume Figueiredo, autor de uma seção com dicas para observar aves do site do Clube de Observadores de Aves.

“Faz muito tempo que não vejo moleques com estilingues em Barão Geraldo”, concorda Jacques Vielliard, referindo-se à área verde no centro de Campinas. Francês que chegou ao Brasil em 1973, a convite de Zeferino Vaz, então reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ele implantou e até hoje dirige o laboratório de bioacústica desta universidade. Lá estão milhares de registros das vozes de aves, captados nos diferentes ecossistemas brasileiros e minuciosamente catalogados.

Parte das 15 mil fitas gravadas serviu para produzir 5 CDs, que ajudam os amantes da natureza a identificar aves. O mais recente, Aves do Pantanal, reúne o canto de 68 aves pantaneiras.

“Muitas pessoas conscientizaram-se que podem fazer voltar espécies, plantando flores e árvores frutíferas para atraí-las, e colocando aqueles vidrinhos com água açucarada para os beija-flores”, diz Vielliard, ao relatar a presença na cidade de sanhaços, pintassilgos, colheirinhos e até dos tico-ticos, que tinham desaparecido.

“A rolinha marrom, ave nativa brasileira, invadiu todo estado de São Paulo. O fogo-apagou adaptou-se às praças urbanas”, ilustra o professor.


filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa

inicio desta página


NÃO SE EMPOLGUE

Um alerta de todos os especialistas: é preciso não se empolgar com a notícia da maior presença de aves nas cidades. “Enquanto uma espécie se beneficia, outras são prejudicadas”, avisa Vielliard.

Ele relembra um caso muito divulgado na mídia - o desaparecimento da última ararinha azul, que vivia no sertão baiano. “O mais perigoso são as espécies que não saem do micro-habitat onde vivem, dependendo de um único tipo de vegetação. Quando esta vegetação é devastada, a ave não tem como sobreviver”, ensina o professor.

“Não vemos espécies de solo na cidade, como o inhambu e a codorna. Também são raros gaviões, exceto o gavião peneira, que come ratos”, acrescenta Figueiredo. Com a destruição dos ecossistemas nativos, avisa, as espécies mais sensíveis, que são maioria, são condenadas à extinção.

Em outras palavras. Só uma as espécies mais generalistas, sinantrópicas (que se adaptam às áreas ocupadas pelo homem) - como o bem-te-vi e a rolinha -, consegue aproveitar as novas condições, usufruindo a vantagem de que alguns inimigos naturais desapareceram. “O aumento da população de sinantrópicas pode ser sinal de desequilíbrio ecológico”, vaticina o observado.



filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa
inicio desta página


GRANDES NÚMEROS



No mundo, há pelo menos 9,7 mil espécies de aves já identificadas pelos cientistas. Cerca de um terço (3,2 mil) estão na América do Sul. O Brasil tem grande parte destas espécies.

“Em 1977, o ornitologista Helmuth Sick, autor de vários livros com descrições de nossas aves, contabilizou 1.677 espécies de aves já descritas no país”, diz o ornitologista Pedro Develey, que finaliza seu doutorado em ecologia de aves, pesquisando como a fragmentação e o estado de conservação da floresta nativa influem na conservação (ou não) das espécies de aves na mata atlântica.

Apaixonado pela observação de aves desde a infância, quando passava os fins de semana num sítio, ele já começou a se especializar no final da década de 1980, quando cursava biologia na Universidade de São Paulo.

Develey contribuiu para a publicação 'Aves no Campus', coordenado pela professora Elizabeth Höfling, que se tornou sucesso editorial. Ao apresentar espécies vistas na USP, o livro tornou-se um guia para identificar as mesmas espécies presentes em outras praças e jardins urbanos.

“Chegamos a observar na USP aves consideradas raras, como pavó, certos tipos de gavião e até a araponga. Ocorre que, não tão longe, ainda há áreas verdes, como a Serra da Cantareira, a Reserva do Morro Grande (Cotia) e a Mata Atlântica”, interpreta Develey. Ele avisa: parte das aves é sazonal, ou seja, aparece na cidade só em uma época do ano. O campus universitário, explica, é uma ilha de verde na cidade grande, bom abrigo para aves, fixo ou temporário.

Repetindo afirmações de outros ornitólogos - que apenas espécies mais maleáveis transformaram a cidade em novo lar -, ele resume os principais fatores para a adaptação: comida adequada à espécie, local para nidificação e abrigo.

“Ao notarem que a cavidade das telhas é parecida às de árvores, onde costumam nidificar, as maritacas aprenderam a sobreviver nas áreas urbanas”, admira-se o cientista, citando-as como exemplo de espécie que se adapto.


filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa
inicio desta página

INTERIOR, TAMBÉM PREJUDICADO

 

E no interior? Develey é um dos que apostam que a avifauna do interior paulista sofreu com a destruição de ecossistemas nativos, substituídos por monoculturas agrícolas (como cana-de-açucar), pólos industriais e cidades (quase sempre pouco arborizadas). “As espécies mais exigentes desapareceram”, diz ele, repetindo o diagnóstico do professor Willis, para quem a metade das espécies nativas do Estado poderá sumir nos próximos anos.

Por outro lado, assim como nas cidades, também no campo beneficiam-se as espécies mais adaptáveis às novas condições. É o caso da siriema, típica de cerrados, que está conseguindo sobreviver em áreas desmatadas. O jacu, antigamente perseguido por caçadores, voltou a se multiplicar, graças à diminuição da caça. Em compensação, a jacutinga, da família do jacu, está entre as muitas espécies praticamente extintas.

Develey tem uma esperança. Levantamentos recentes revelaram a redução do desmatamento no território paulista. Acreditando que a obrigatoriedade de Estudos de Impacto Ambiental para empreendimentos maiores e a criação de áreas de proteção ambiental contribuem para a conservação, ele acredita na ação do Homem para evitar a extinção das espécies.

Em parceria com o fotógrafo Edson Endrigo, Develey prepara um guia de observação de aves, reunindo textos e fotos de 272 espécies vistas na cidade ou na Mata Atlântica. “Um guia de campo é fundamental para que qualquer interessado identifique o que está vendo”, diz ele.

 

filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casa
inicio desta página

 

OBSERVANDO AVES


Os ornitólogos, profissionais ou amadores, ensinam que a observação de aves pode ser feita em qualquer ambiente: no jardim de casa, na varanda do apartamento, em praças urbanas, ou ecossistemas nativos. Cada local tem espécies típicas, o que torna a atividade mais interessante.

Para Pedro Develey, esta é uma atividade relaxante, gratificante, de baixo custo. “Basta olhar para o jardim de casa, para o caminho do dia a dia, ficando atento para uma ave que sempre presente no local (é o seu território), ou a época em que canta mais”.

Para ir mais longe, diz o cientista, o primeiro passo é conseguir um binóculo e uma cadernetinha, e anotar todos os detalhes: como é a plumagem da ave, sua postura, tamanho, tipo de bico, características local onde se encontra.

O guia de campo, livro com fotos (ou desenhos) e descrições das espécies, ajudará na identificação. Importante é tentar saber sempre mais “Quando aprendo que sanhaço é da família do traupídeos, e que a saíra é da mesma família, vou comparar ambos. Com o tempo, saberei fazer a classificação rapidamente, até sem o guia.”

Quem gostar, começará a prestar atenção na vocalização, que é diferente para cada espécie. A primavera - época de reprodução, quando muitas procuram parceiro para acasalar, bem como local para seus ninhos - é quando mais seu ouve o cantar. Cada espécie tem seus gritos de alarme, para marcar território, do macho para atrair a fêmea, e assim por diante.

Em suas incursões pelos diferentes ecossistemas brasileiros, como Amazônia e Mata Atlântica, além de um bom binóculo e da caderneta de campo, Develey sempre leva um gravador, instrumento de dupla função para o observador de aves.

“É comum não ser possível ver algumas aves, principalmente as que se alojam no dossel (parte mais alta) da mata. Mas ouço sua vocalização. E, mesmo que não a reconheça imediatamente, quando gravo seu canto, poderei, posteriormente, fazer a identificação em laboratório, comparando com gravações já existentes.”

A segunda função de um gravador é atrair as aves. “Ao ouvir o canto de outra da mesma espécie, a ave tende a se aproximar, para ver quem está em seu território. Ou seja, se desconfio que determinada espécie vive no local que vou visitar, toco o CD, ou fita que contenha sua vocalização. Se no local, houver ave da mesma espécie, ela irá responder, ou chegar perto”.

Quando não havia instrumentos eletrônicos portáteis, lembra o estudioso, tinha quem soubesse construir apitos especiais, que imitavam o som de pássaros. Eram muito úteis, e ainda podem ser usados.

A fotografia, completa o ornitólogo, também é importante. Develey, que não se considera bom fotógrafo, usa imagens registradas por profissionais amigos para ilustrar palestras que profere.


PARA SABER MAIS:

  • Livros:
    Aves do Campus (editora Edusp),
    Aves Brasileiras (Dalgas Ecotec),
    Todas as Aves do Brasil (Dall)
  • CDs: informações
    fax 19-3289.0942, ou amazilia@uol.com.br

 


filie-se à AIPA e receba o Urtiga em casainicio desta página

LEIA TAMBÉM

O PAPEL DOS OBSERVADORES DE AVES
Será que as aves estão repovoando cidades mesmo??
(confira a resposta e resultado de pesquisa de fauna e flora em Itu)

 

VOLTAR


mande seu e-mail
Clique na imagem para mandar seu e-mail
com comentários, críticas, sugestões

inicio desta página
      Home   => Conheça a AIPA   => Jornal Urtiga    => Índice Urtiga 157