LARGO
DA MATRIZ DE ITU
(poesia,
publicada no livro Poesia Ituana, e dedicada ao antigo Largo da Matriz, dos
anos 1950)
Retornando no tempo, há muitos anos atrás, encontro-me no Largo
da Matriz, de uma pequena cidade do interior, com frondosas árvores
ao meu redor. Percorrendo o passeio de terra batida, paro em frente
à centenária figueira, onde pássaros em sinfonia de sons,
disputam ávidos os frutos adocicados. Penso na velha e majestosa
figueira, que assistiu às procissões da Matriz, os carros
de boi rangendo com a carga, os troles passando com as donzelas.
Mais ao lado um pé de abieiro, onde sanhaços, sabiás
e saíras, na árvore cheia de frutos e flor, comem a fruta
exótica de raro sabor. Continuando o meu passeio na rua de areia,
contemplo uma fila de lindas tamareiras, enfeitando qual oásis do deserto,
o espelho d’água com peixes amarelos. Em frente à Matriz,
um pé de canela, trazido talvez, por emigrantes na caravela. majestosas
cabreúvas, perobeiras e paus-brasis, enfeitam o jardim do Largo da
Matriz Os canteiros com flores heterogêneas, beija-flores de
cores cintilantes borboletas e insetos multicoloridos, adejando em dança
entre as flores. O coretinho no meio das árvores, onde as
bandas da cidade, em disputa, executam marchas e dobrados aguardando a
grande festa. Largo da Matriz com a noite silenciosa, sem buzina,
sem ronco de motor, sem fumaça, sem rock and roll e entorpecente,
no mais sadio passeio da cidade. É triste ter acordado deste sonho,
e ver o largo da matriz destroçado, as árvores doentes, gramados
poeirentos, os passeios de pedra exalando calor. Como era belo o
meu Largo da Matriz, destruído pela desculpa do progresso, sufocando
as plantas, sem sombra e frescor, ficando sem romantismo e sem amor ...
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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A
PEDRA MOUTONNÉE DE SALTO Na espessa e densa vegetação
da mata, Salientava solitária e toda enfeitada, Misturando-se com
o verde, majestosa pedra; Toda recoberta por musgo, samambaia e flores.
Quantas coisas belas esta pedra testemunhou; Assistiu a piracema subindo
e cristalino Tietê, Quando saltavam na cachoeira espumante e fria,
Enormes dourados, piavas, pintados e lambaris. Grande e solitária
pedra toda enfeitada, Que presenciou a passagem ao teu lado, Dos fortes
e ferozes guerreiros Tupis, Se deslocando pela mata a caça do tapir.
Enorme rocha sólida e resistente, Onde a onça pintada espreita
a caça, Na trilha das pacas, antas e capivaras, Num salto acrobático
no dorso da anta. Grande e solitária pedra de granito, Que
contemplou a descida das monções, Com Bandeirantes destemidos
pelo rio, A procura de ouro, esmeraldas e safiras. Pedra, testemunha
da pureza da mata, Que solveu o orvalho cristalino, Descendo pelo teu
corpo até o chão, Junto a vertentes translúcidas e limpas.
Grande pedra, hoje tu estás desnuda, Ao teu redor não tem
pássaros e selvas, O rio não tem peixes e vida aquática,
Nem a pureza das vertentes cristalinas. Rocha pura e solitária,
você não morreu; O “homo sapiens” destruiu o teu jardim,
As lindas árvores não lhe dão mais sombra, Tu não
tens mais os brincos e colares de flores ...
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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O
SABIÁ Na espessa mata
fechada, Entre rios, córregos, cachoeiras E vertentes cristalinas
e frias, nasceu o sabiá laranjeira. Em seu ninho fofo e macio,
No meio de orquídeas perfumadas E as flores da primavera Crescia
alegre e sadio o sabiá laranjeira Muito cedo o filhote aprende
a voar, Sempre guiado e vigiado pelos pais. O sabiá esperto e confiante,
Voa apenas perto dos pais vigilantes. O sabiá, agora com segurança,
Se projeta em vôos longos e rasantes, À procura de frutos silvestres
Abundantes nas matas circundantes. O seu canto suave e harmonioso,
Enchia a floresta de sons. A floresta emudecia ao gorjeio Do mestre sabiá
laranjeira. Mas o seu canto mavioso não passa despercebido
pelo homem, Que com malícia e negaça, Aprisiona o feliz
sabiá. Em pequena gaiola aprisionado, Pendurado em um cômodo
imundo, Cheirando a excremento humano, O sabiá foi definhando.
Não comia, apenas água poluída bebia, Sonhava com
a floresta perfumada, As frutas frescas e saborosas, As águas cristalinas
e puras. Triste e solitário, com o corpo com feridas, As penas
sem brilho de lutar pela vida, O sabiá foi morrendo aos poucos
Sem a vida que tanto queria.
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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O
CONDOR Bela, forte e altaneira, Com sua envergadura de porte,
Olhos ligeiros, garras poderosas, É o condor a ave dos Andes.
Corpulento o rei das alturas, Seus olhos são penetrantes, Voa imponente
junto às nuvens No frio cortante dos Andes. O condor a águia
dos Andes, Voa com acrobacias e esplendor, O homem querendo imitar a ave,
Com as coloridas asas delta, Nunca chegará a igualar A versatilidade
e beleza do condor.
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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AO
MEU AMIGO Mais um ano está a findar Muitas comemorações
e felicitações. Os homens trocam entre si, Frases bonitas,
desejando boas festas. Tudo parte exteriormente, sem intenção.
Estou a refletir sobre essas coisas Em minha mesa de trabalho. Relacionei
diversos nomes para felicitações, Mas estou em dúvida,
se devo mandar, Cada um deles não mostrou ser amigo verdadeiro;
Atrás de muitas bajulações e apertos de mão,
Está apenas o interesse material. Não existe sinceridade, apenas
hipocrisia. Tudo gira em torno de usufruir vantagens Das pessoas que se
projetam financeiramente. Continuo na minha reflexão, Mas
não consigo encontrar a pessoa certa, Para endereçar o meu cartão
de natal. Entre todos os selecionados, todos iguais, Apenas, interesses
pessoais, nada mais. Enfim, encontrei o amigo verdadeiro. Estou redigindo
palavras bonitas Saídas do coração para o meu grande
amigo, Sei que não vou receber resposta do meu cartão. O
meu amigo não escreve, não fala, não é mudo, Mas
não tem o dom da escrita e da palavra. Não importa, ele
é o amigo sincero na verdadeira expressão da palavra. Este meu
amigo não escreve, não fala, mas me faz carinho Sabe quando
estou triste ou alegre. E me procura mesmo que não tenha banquete para
lhe oferecer. Este meu amigo, vou dizer quem é É o meu cão,
o meu melhor amigo.
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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LAIKA
Quando fomos te ver Você estava toda sonolenta Com os olhinhos
semi-abertos Quase desaparecendo na pelugem macia. Havia, não
me lembro bem. Era você e mais três irmãos. Apesar
de ser uma menina, Você era grande e soberba. Após te
carregar nos braços e te mimar como uma criança. Te levamos
para casa, Como nossa filha caçula. Lembro-me bem a primeira
noite, Ela ficou num caixotinho. Parecendo um bicho de pelúcia,
Enfeitando um quarto de criança. Você foi crescendo forte
e bonita, Agora adolescente alegre e bricalhona. Brincando com a bola
jogada pelas crianças, Parecia entender o vocabulário humano.
Laika era linda, teus pelos macios. Teu olhar amoroso e terno, Refletia
o amor em teus donos. Sentia alegria, saudades e amor, Entendendo
o estado emocional, Daqueles que a amavam, E lhe davam carinho.
Laika você era uma companheira, Beijava o meu rosto, e carinho retribuía,
Brincava de correr e de esconde-esconde, Laika era a eterna companheira.
Laika você sempre fez parte Da nossa família, Chorava,
sorria encantava Você amava todos com alegria. Ao longe sempre
ouvia teus latidos. Nunca te esqueci, nos rolávamos no tapete.
Você espirrava e levantava E abocanhava meus braços com ternura.
Passei tanto tempo sem te ver Mas sempre a tinha no pensamento. Queria
correr a teu encontro Sentir a alegria em teu rosto. Mas hoje é
impossível Você partiu sem me avisar Foi para a eternidade
com sua alma pura. Adeus... Laika, sempre te amei. Hoje com lágrimas
nos olhos Lembro com saudades da minha eterna Laika. Você não
morreu, o teu espírito, A tua bondade permanecerá Sempre
junto daqueles que você amou.
(Joaquim
Roberto de Araujo)
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LEIA
TAMBÉM TESOURO
ESCONDIDO ... Em 2003, após o falecimento,
sem explicações, de Joaquim Roberto de Araújo, a família
encontra poeslias ecológicas, que ele escreveu e raramente mostrouJOAQUIM
ARAÚJO E SUAS POESIAS ECOLÓGICAS (página em construção) a
reportagem publicada em 1987 no Urtiga, em que o poeta revelava o amor
pela causa ambiental |
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