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HISTÓRIA AMEAÇADA(Publicado no URTIGA 160 - janeiro/fevereiro 2004- pags. centrais) |
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PARQUE ARQUEOLÓGICO AMEAÇADO DE EXTINÇÃO SÍTIOS
MAIS ANTIGOS E MAIS: SURPREENDENTE
MATA BRANCA |
PARQUE ARQUEOLÓGICO AMEAÇADO DE EXTINÇÃO
Um dos mais importantes parques nacionais do país, Parque Nacional da Serra da Capivara, situado em São Raimundo Nonato (PI), corre risco de extinção. O alerta foi dado em janeiro pela arqueóloga Niède Guidon, presidente da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), entidade que o administra, em parceria com o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis). Criado em 1990, depois de 20 anos de estudos científicos, ele ganhou o título de Patrimônio da Humanidade pela Unesco, em 1991. É que ele contém uma das maiores concentrações de pinturas rupestres do mundo, além de outras marcas de nossa pré-história, como sinais de presença humana de mais de 50 mil anos atrás (veja matéria nesta página). Mas a falta de verba ameaça a conservação da área. . TRANSFORMAÇÃO APÓS DESCOBERTA
Região que sofria diferentes formas de devastação, incêndios, invasões, caça predatória até 1990, o Parque tornou-se fonte de renda e orgulho das famílias da região. Dos mais de 400 sítios arqueológicos identificados no Parque Nacional, que trazem os vestígios de uma civilização milenar, 107 foram preparados para a visitação. São condutores locais, que acompanham os visitantes. Também moradores da região trabalham com os arqueólogos nas escavações e preparo de sítios arqueológicos para o turismo. Usando rampas especialmente construídas, turistas vêm de perto os desenhos nas paredes rochosas, surpreendendo-se com a riqueza de detalhes. Visitando o Museu do Homem Americano checam as provas de que o Brasil tem muito mais de que 500 anos de história. Uma exposição didática revela que a região da Serra da Capivara - que já foi mar (veja matéria nesta página) - não se transformou imediatamente em sertão. Houve a fase de floresta, onde viveram gigantescos animais, como mamutes e preguiças gigantes. Por motivo desconhecido, o clima mudou repentinamente e esta fauna desapareceu As coleções de pedras lascadas e polidas pré-históricas, cerâmicas, múmias e partes de esqueletos
humanos, ensinam ao visitante detalhes sobre esta civilização que não se baseava nos valores monetários. Os arqueólogos falam em três épocas:
GERAÇÃO DE RENDA
O turista poderá também visitar a oficina de cerâmica, espécie
de escola profissionalizante que gera renda para os moradores. Com argilas da
região, peças são modeladas em tornos, ganham desenhos inspirados
nas inscrições pré-históricas, passam pela primeira
queima, são então cobertas por pigmentos e novamente queimadas,
transformando-se em sofisticados pratos, vasos, copos.
Pedrinhas pintadas com motivos pré-históricos e peças em madeira são outras formas de artesanato incentivadas pela Fumdham e vendidas aos turistas.
“Tornamo-nos o maior empregador da região”, orgulhava-se Niède Guidon numa conversa em 2001, quando mostrou o Parque e um dos núcleos de apoio à comunidade, com escola, alojamento, centro de saúde e poço. Eram mais de cem funcionários trabalhando diretamente no parque, museu e centro cultural.
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Vista
aérea do museu, na caatinga em tempos de chuva |
Sem os repasses do governo federal, Niède alerta que a Fundação vai desistir da co-gestão do Parque. Com isso, restariam apenas três funcionários contratados do Ibama e mais seis terceirizados, para proteger os mais de 100 mil hectares de história brasileira.
Em janeiro, ela denunciou pela grande imprensa que, que as falhas nos repasses ocorrem desde 2001. Primeiro, a venda de dois carros pagou os funcionários da fundação. Agora, sem a verba, eles vão sendo dispensados.
Os recursos viriam do Ibama e do Ministério da Cultura (Minc), com quem a Fumdham tem convênio, para manter o patrimônio arqueológico. Seriam necessários R$ 227 mil mensais para manter toda esta estrutura.
Falando ao jornal O Estado de São Paulo, a arqueóloga descreveu pedidos R$ 500 mil ao Minc e de R$ 600 mil ao Ibama, para um ano de atividades. Deste valor, a diretora de Ecossistemas do Ibama, Cecília Ferraz, confirmou que o órgão federal repassou R$ 438,4 mil, em 2003. Admitindo ser menos que o necessário, a diretora do Ibama justificou ao Estadão que “essa situação no Brasil também ocorre na área da saúde, da educação e outras.”
Enquanto isso, este patrimônio da humanidade, com potencial de receber 3 milhões de visitantes do ano, segundo estudos uma fundação suíça mencionados por Niéde, vai minguando aos poucos. As perdas, com a falta de fiscalização e de pessoas para cuidar das riquezas naturais, podem ser irrecuperáveis.
(todas fotos que ilustram esta matéria são do arquivo FUMDHAM)
SÍTIOS MAIS ANTIGOS Esta saliência funciona como um teto que protege do sol e da chuva. Com o progresso da erosão, a saliência torna-se cada vez mais pronunciada até que, sob a ação da gravidade, fratura-se e desmorona. Os homens utilizaram a parte protegida dos abrigos como casa, acampamento, local de enterramentos e suporte para a representação gráfica da sua tradição oral. Sobre os vestígios deixados por um grupo humano, a natureza depositava sedimentos que os cobriam. Novos grupos, novos vestígios, nova sedimentação. A repetição desse ciclo durante milênios forma as camadas arqueológicas, nas quais os arqueólogos encontram todos os elementos que permitem a reconstituição da vida dos povos pré-históricos. Na linguagem regional os abrigos são chamados tocas. TOCA
DO BOQUEIRÃO DA PEDRA FURADA: O processo de formação das camadas arqueológicas deste sítio durou, no mínimo, 60.000 anos. As escavações, iniciadas em 1978, duraram 10 anos e permitiram a descoberta dos mais antigos vestígios, até hoje conhecidos, da presença humana nas Américas: fogueiras estruturadas e uma grande quantidade de artefatos de pedra lascada. Blocos de parede com pinturas, caídos sobre as camadas arqueológicas, permitiram a datação das mesmas. Os vestígios mais antigos são duas manchas vermelhas datadas de 23.000 anos, dois segmentos paralelos de reta datam de 17.000 anos, enquanto que pinturas representando temas semelhantes aos que subsistem hoje nas paredes foram pintadas entre 12.000 e 6.000 anos atrás. Nesse sítio foi possível reconstruir a história das ocupações humanas desde há cerca de 60.000 anos até 6.000 anos atrás. SÍTIO DO MEIO
O Sítio do Meio encontra-se a apenas 3 metros acima do nível do vale e foi cavado por um caudaloso rio que nascia no boqueirão que passa frente ao abrigo. O rio cavou a base da parede e, quando a projeção do teto ficou muito grande, sem sustentação, houve um primeiro desmoronamento, que cobriu a praia do rio. Esse episódio se deu há 20.000 anos. Os homens aproveitaram essa parede e se instalaram atrás dela, protegidos dos ataques dos animais. Depois do primeiro houve mais 3 grandes desmoronamentos, sendo que o último aconteceu há cerca de 8.000 anos. Este sítio é importante porque nele encontramos: fragmentos da cerâmica mais antiga das Américas, datada de 8.960 anos, o primeiro artefato americano de pedra polida, uma machadinha datada de 9.200 anos. Durante muitos anos, até os anos 60, foi utilizado como casa de farinha. Quando iniciamos a escavação encontramos os restos de um forno de farinha, que foi reconstruído segundo a tradição local. A escavação deste sítio ainda não foi terminada.
TOCA DO CALDEIRÃO DOS RODRIGUES
A Toca do Caldeirão dos Rodrigues é um abrigo formado em um vale alto, cerca de 80 metros acima do vale do Boqueirão da Pedra Furada. Suas pinturas, escondidas atrás de um imenso bloco caído, retratam cerca de 12.000 anos de evolução estilística e cultural. As escavações, ainda não terminadas, já permitiram encontrar vestígios da presença humana de 18.000 anos.” (trecho do livro “Serra da Capivara”, publicado pela Fumdham) PARA SABER MAIS:
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