DECLARAÇÃO DE BRASÍLIA PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL - 1997

 


 
Como preparação brasileira para a Conferência de Thessaloniki, que avaliaria os 20 anos da importante Conferência de Tblisi, que definiu os rumos da Educação Ambiental, o Brasil fez sua Conferência. Abaixo, o capítulo do livro "Implantação da Educação Ambiental no Brasil", de Silvia Czapski, publicado pelo MEC, com Unesco, que traz o resumo das conclusões

 

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"Quarenta e cinco "problemáticas" e cento e vinte e cinco recomendações. Estes são os números da "Declaração de Brasília para a Educação Ambiental". Produzida em novembro de 1997, a partir dos relatórios regionais da 1ª CNEA, ela foi levada em dezembro do mesmo ano para a Conferência de Thessaloniki, na Grécia, como documento oficial do Brasil sobre a Educação Ambiental. Na sua leitura, dá para entrever - de novo - a persistência do quadro negro para o setor no país, constatando-se que as palavras "carência" e 'falta" estão entre as mais presentes. O documento é longo, valendo conhecer pelo menos o resumo das colocações, para cada uma das cinco áreas temáticas propostas:

1 - Educação Ambiental e as vertentes do desenvolvimento sustentável -

Contendo dois sub-temas, um relacionado à Agenda 21 e outro à Educação Não-Formal, este capítulo levantou, como primeira "falta", a não-concordância em torno do termo "desenvolvimento sustentável". A idéia central é a busca do bem-estar das gerações atuais, sem prejudicar a sobrevivência dos que estão por nascer.

Mas, a partir disto, as definições mudariam, atendendo a interesses e posturas dos diferentes setores sociais. O "Documento de Brasília" recomendou a construção de um conceito de desenvolvimento sustentável "a fim de assegurar à sociedade a compreensão objetiva, os caminhos concretos e efetivos para a educação ambiental".

Outra "falta" estaria no setor universitário, que deveria desenvolver metodologias e materiais de apoio para a EA. E mais: segundo o texto, o governo desobedeceu ao compromisso de divulgar a Agenda 21 e não construiu uma Política de Educação Ambiental. adequada às realidades regionais, estaduais e municipais.

Não pára aí: o documento também denunciou a falta de articulação entre esferas do governo e organismos da sociedade civil, a insuficiência de recursos humanos para o setor e a ausência de interdisciplinaridade. E concluiu que, devido a tantas carências, a Educação Ambiental, ficou em segundo plano, não vislumbrando uma solução para isto, a curto prazo.

Para responder ao diagnóstico pessimista, o capítulo trouxe vinte e sete recomendações. Por exemplo, sugeriu atividades para gerar um "posicionamento da sociedade brasileira frente aos desafios do desenvolvimento sustentável", como a organização de debates em nível local e regional, com ampla participação da sociedade.

Entre os temas a discutir, estaria a questão ética nas áreas econômica, política, social. Também recomendou o incentivo técnico e financeiro para "constituir um sistema integrado de EA em todos os níveis, de modo a permitir a construção de uma política de Educação Ambiental e o fortalecimento de redes interinstitucionais no setor, envolvendo inclusive instituições do ensino superior".

O apoio foi igualmente sugerido para viabilizar projetos de pesquisas básicas e aplicadas em campos como o desenvolvimento de meios alternativos de produção ou o uso de fontes não poluentes de energia. A democratização das informações, o incentivo ao ecoturismo e a divulgação das fontes de financiamento para EA também foram recomendações do capítulo, que dedicou as últimas sugestões a ações práticas, como o pedido de urgência para compatibilizar as legislações ambientais no âmbito do Mercosul e rever os licenciamentos pelos órgãos ambientais dos projetos de desenvolvimento na Amazônia. "

2 - Educação Ambiental Formal - papel, desafios, metodologias, capacitação

De acordo com o texto de Brasília, no final de 1997, permanecia o modelo de educação derivado do "paradigma positivista e da pedagogia tecnicista, que postulam um sistema de ensino fragmentado em disciplinas", que é diferente do que quer a Educação Ambiental. De uma extensa lista de carências apontadas, dá para destacar:

    1. a falta de capacitação dos professores para a EA, bem como de estímulos salariais e profissionais para o corpo docente;
    2. a carência de pesquisas para produzir, por exemplo, metodologias pedagógicas de EA para o ensino formal.
    3. a falta de materiais didáticos adequados para o trabalho em sala de aula, e entre os disponíveis, a não-adequação para a realidade local de quem ensina,
    4. a falta de uma política nacional "eficaz e sustentada que promova a capacitação sistemática dos responsáveis pela educação ambiental formal.".
    5. a ausência de articulação entre o MEC, as delegacias estaduais de ensino, secretarias de educação e as escolas, e destes órgãos com outras instituições, governamentais e não governamentais,
    6. a falta de compreensão (ainda!), da classe política em geral, de que Educação Ambiental não deve ser entendida como uma disciplina a mais no currículo devendo, pelo contrário, permear todas as áreas.

Em contraste a estas e outras ausências, o documento criticou os "conteúdos muito carregados" em relação à transmissão de conhecimentos, nos três níveis de ensino: isto dificultaria uma análise mais aprofundada de cada tema e, portanto, a inserção da dimensão ambiental na educação.

Como remédios para este quadro complicado, o documento reuniu vinte e quatro recomendações para o desenvolvimento da Educação Ambiental no Ensino Formal, a começar pela proposta de reestruturar os currículos, nos três níveis de ensino, de modo a incorporar a temática ambiental de forma interdisciplinar, e estimular a "elaboração de novas perspectivas criativas e participativas para a solução de problemas ambientais."

Sem meias-palavras, também recomendou que os "ministérios assinantes do Programa Nacional de Educação Ambiental - PRONEA (MMA, MEC, MINC, e MCT) devem assumir verdadeiramente a sua implementação prática e priorizar o seu papel de incentivador e financiador do desenvolvimento de pesquisas, cursos de capacitação, materiais educativos e a inserção dos temas ambientais nos currículos de todos os níveis de ensino e de todas as carreiras".

Aí, para cada item, houve detalhamentos. Por exemplo, no caso da capacitação, eis duas das recomendações: incorporar da dimensão ambiental na educação nos cursos de magistério e licenciatura para evitar o custo extra da capacitação posterior na área e incentivar a criação de cursos de pós-graduação em EA.

Também houve recomendações para financiar projetos-piloto de Educação Ambiental no nível formal e apoiar a criação de centros de excelência de cursos de EA. E se pediram investimentos para facilitar o acesso às informações através, por exemplo, da distribuição de livros, revistas, boletins às escolas e instituições ambientalistas, a formação de bancos de informações, de redes, etc.

Por fim, eis dois dos exemplos de idéias para integrar os órgãos públicos entre si, e estes com setores não governamentais: a criação fóruns estaduais e regionais de EA, e a promoção de novos encontros regionais com objetivo de elaborar projetos integrados.

3- Educação ambiental no processo de gestão ambiental - metodologia e capacitação.

Também aí, o retrato revelou carências, como:

  1. a falta de propostas de desenvolvimento sustentável diferenciadas para populações tradicionais,
  2. a falta de conhecimento dos instrumentos de gestão ambiental,
  3. a falta de programas de educação ambiental comunitários, que poderiam se voltar a temas como a conservação dos mananciais ou o problema do lixo
  4. a falta de capacitação de responsáveis pelo estabelecimento da gestão ambiental ao nível público e privado.
  5. a falta de envolvimento das esferas municipais para o gerenciamento ambiental ("o que dificulta uma maior participação da sociedade").

O capítulo trouxe ainda um recado duro para o setor empresarial: "a educação ambiental e a gestão ambiental são tratadas em grande parte pelo setor produtivo como despesa e não como investimento, pela falta de programas de educação ambiental nas empresas, o que leva a confundir educação ambiental com um marketing ambiental".

Outra crítica foi para a "desarticulação na Gestão do Sistema Nacional do Meio Ambiente" , gerando, neste caso, contradições como as determinações do governo federal relativas às unidades de conservação, que "desconhecem as necessidades estaduais e municipais e ignoraram as comunidades que nelas habitam".

Foi a área campeã em número de recomendações - quarenta e duas. Uma das mais abrangentes, propôs "estabelecer políticas públicas comprometidas com as novas posturas éticas, buscando a melhoria da qualidade de vida".

Visando a gestão participativa para implementar o modelo de desenvolvimento sustentável" recomendou-se a criação de "conselhos paritários entre governo e sociedade civil para acompanhamento (..) e avaliação das políticas públicas de educação ambiental", o fortalecimento dos comitês de bacias hidrográficas e dos conselhos municipais de meio ambiente, e ainda a implantação de comitês regionais para discutir ações integradas nas áreas costeiras.

Não desprezando o dinheiro, houve recomendações para que:

  1. os grandes financiamentos introduzissem, como contrapartida obrigatória, a exigência do empreendedor de implementar ações de EA;
  2. se criassem linhas específicas de crédito para Educação Ambiental como reforço às existentes,
  3. houvesse um incentivo real à produção e venda de produtos ecologicamente corretos.

Outra recomendação foi que empresas passassem a apresentar seus "desempenhos ambientais corretos e ações de educação junto às comunidades vizinhas". Já no sub-título "metodologias e capacitação" entrou a recomendação para habilitar municípios e comunidades para a gestão ambiental, além de, é claro, se sugerir a criação de metodologias adequadas às diversas formas de gestão ambiental.

Também se pediu a participação da sociedade no processo de gestão das Unidades de Conservação, "inclusive como forma de aprendizado para o exercício da cidadania". Seguindo o tom de todo documento, pediu-se ainda adequação das diretrizes do PRONEA para esta área, e a instituição dos fóruns de Educação Ambiental.

4- EA e as políticas públicas - PRONEA, políticas urbanas, de recursos hídricos, agricultura, C & T -

Foi o capítulo mais enxuto da "Declaração de Brasília", mas não menos crítico. No diagnóstico ele revelou a "tendência por parte do governo de planejar as políticas públicas de forma setorizada, sem a integração entre o poder público e a sociedade e, ainda a ausência de estratégias que garantam a continuidade dos programas iniciados".

Também criticou a "desconsideração da Agenda 21 na elaboração dos Planos Diretores" e o fato da legislação do setor de energia, saneamento e controle da poluição, não contemplarem o uso de impostos para beneficiar os programas sociais.

Entre as 17 recomendações, vale destacar a proposta de "inserir a componente ambiental em todas as políticas públicas, valorizando o serviço público e o servidor público" e, ao mesmo tempo, de promover a sensibilização destes servidores "quanto aos aspectos ambientais de suas respectivas instituições".

Também se propôs a implementação de uma "política ambiental urbana que considere particularidades regionais e estaduais", colocando a EA como facilitadora do processo, e o estabelecimento de parcerias com o setor produtivo para desenvolver, através da EA, uma postura ética frente ao desafio da questão ambiental.

Tema 5 - EA, ética, formação da cidadania, educação, comunicação e informação da sociedade -

Englobando os meios de comunicação e os processos de informação e organização da sociedade, este capítulo buscou, no quesito "problemática", algumas causas para a má divulgação dos problemas ambientais, ou simplesmente a sua ausência. Um motivo seria a falta uma política de comunicação para esta divulgação. Mas, junto a isso, estaria o "monopólio dos meios de comunicação", o não- compromisso com a qualidade de informação e o despreparo dos profissionais de comunicação para cobrir a área, que por isso transmitiriam conceitos errôneos.

Eis três dos resultados apontados:

  1. incentivo ao consumismo desenfreado, "através da propaganda de produtos supérfluos e poluentes, estimulando a agressividade social e a violência, prescindindo de valores éticos como a solidariedade e cooperação",
  2. a "impossibilidade pelo alto custo, especialmente na televisão, de veicular informações e programas de educação ambiental, e
  3. o sensacionalismo em relação aos fatos ambientais, quando eles chegam ao noticiário.

Entre as 15 recomendações para mudar este quadro o destaque vai para a proposta de democratizar os meios de comunicação de massa, garantindo a participação da sociedade civil. Além disso, houve sugestões de abrir espaços à divulgação de "experiências de EA, valorizando: o homem, o meio ambiente e os valores éticos fundamentais" e também dos conhecimentos das populações tradicionais.

Em relação aos profissionais de comunicação, a idéia foi "motivar a mídia a assumir seu papel de formadora de opinião social, veiculando informações corretas e dirigidas à formação do cidadão, estimulando o maior comprometimento com a questão ambiental", através de ações como seminários e o trabalho com questões ambientais nos cursos de comunicação nas universidades.

A divulgação das leis ambientais através da mídia, o fortalecimento de um sistema de comunicação interestadual em EA, a veiculação da Agenda 21 de maneira compreensível para o cidadão e a promoção de eventos com ampla participação da sociedade, foram outras propostas do capítulo final do documento.

Fonte: livro "A Implantação da Educação Ambiental no Brasil",
de Silvia Czapski, edição MEC/Unesco, 1977

 

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