CARTA DE MOSCOU - 1987

 


 
Documento escrito pelo especialista Genebaldo Dias Freire que apresenta dos resultados da Conferência de Moscou, que reuniu centenas de especialistas naquela cidade, para abaliar efeitos da Conferência de Tblisi e traçar estratégias para a década seguinte no campo da Educação Ambiental

 

Ajude a divulgar as atividades da AIPA

VOLTAR

Reunidos em Tbilisi, trezentos especialistas de cem países, mais observadores da União Internacional para a Conservação da Natureza (Iucn), reuniramse em Moscou, CEI (17 a 21 de agosto de 1987), para o Congresso Internacional de Educação e Formação Ambiental, promovido pela Unesco, com Programa de Meio Ambiente da ONU (Pnuma) e Programa Internacional de Educação Ambiental (Piea).

O Congresso objetivou a discussão das dificuldades encontradas e dos progressos alcançados pelas nações, no campo da educação ambiental, e a determinação de necessidades e prioridades em relação ao seu desenvolvimento, desde a Conferência de Tbilisi.

Do encontro, saíram as estratégias internacionais para ações no campo da educação e formação ambiental para a década de 90.

ORIENTAÇÕES, OBJETIVOS E AÇÕES PARA A ESTRATÉGIA INTERNACIONAL ACESSO À INFORMAÇÃO

Durante o último decênio os órgãos internacionais, particularmente a Unesco e o Pnuma, fizeram esforços para favorecer o intercâmbio de informações e a difusão de idéias novas em matéria de educação ambiental. É crescente o número de países, grupos e pessoas interessadas nas atividades de desenvolvimento da educação ambiental que se converteram em demandas e até produtores de informação.

Disto resulta que o intercâmbio de informações e experiências constitua um imperativo da perspectiva de universalização da educação ambiental.

Assim, com o objetivo de fortalecer o sistema internacional de informações e intercâmbio de experiências do Programa Internacional de Educação Ambiental determinaramse as ações:

· estabelece um serviço computadorizado (Internacional Computerized Information Service for Environmental Education);

· fortalecimento de redes regionais de instituições de excelência e centros de documentação; publicação do jornal Connect (v observação ao final)

PESQUISA E EXPERIMENTAÇÃO

Durante a última década muitos países iniciaram trabalhos no campo da educação, a fim de aperfeiçoar, a partir da análise das necessidades e problemas, inovações relativas ao conteúdo, métodos e estratégias de uma educação e formação que correspondam aos princípios e objetivos da educação ambiental.

Com essas pesquisas foi possível conceber novas maneiras de concentrar os conteúdos educativos, recorrendo a temas integradores ou a perspectivas sistemáticas, bem como procedimentos pedagógicos ativos que favorecem a participação, o compromisso social e a responsabilidade dos destinatários do processo de educação ambiental.

A despeito dos esforços dos países, ainda não foram elucidados, suficientemente, certos problemas antigos ou novos , de ordem conceitual e metodológica. Por esta razão, alguns especialistas se perguntam, levando em conta a resistência psicológica e corporativista que encontraram, se convém contemplar o conteúdo da educação ambiental, desde uma perspectiva exclusivamente interdisciplinar, ou, se devido ao seu alto custo, seguir preconizando estratégias pedagógicas como a utilização de equipes multidisciplinares de professores.

Outrossim, cabe perguntar se é válido executar, tanto internacional quanto regional e subregionalmente, certas atividades de educação e formação (seminários, encontros, cursos específicos etc.) cuja eficácia quantitativa e cujas repercussões institucionais parecem, àl;s vezes, muito limitadas.

Na verdade, dessas iniciativas, só participam, em geral, alguns professores ou administradores, aos quais se somam alguns planejadores que, ao retornarem aos seus órgãos de origem, não dispõem dos meios para suscitar a mobilização institucional, estrutural e financeira que seriam necessárias para influir de verdade na definição das políticas nacionais de educação, meio ambiente e desenvolvimento.

No relatório final da Conferência de Tbilisi, já encontrávamos recomendações de estratégias para a pesquisa e experimentação em educação ambiental. Acentuouse que todas as atividades nessa área exigiriam igualmente ações de pesquisa e experimentação sobre as orientações, o conteúdo, os métodos e os instrumentos necessários para a sua execução.

Assim, foram estabelecidas as seguintes prioridades:

a) pesquisa e experimentação relacionadas a conteúdos e métodos educacionais. Tais programas devem produzir um refinamento dos conceitos fundamentais de uma cultura ecológica, formular os padrões de uma ética ambiental, e elaborar metodologias para a educação ambiental de todos os grupos sociais;

b) pesquisa e experimentação relativas a outros aspectos complementares da educação ambiental. Devem ser dirigidas com a finalidade de identificar pontos de convergência e complementaridade com outras atividades educacionais, cujos conteúdos estejam relacionados a aspectos fundamentais do ambiente humano, em particular, àl; educação voltada àl; nutrição e saúde;

c) pesquisa relacionada àl; abordagem pedagógica para a questão dos valores. A educação ambiental lida também com aspectos afetivos e axiológicos. Estes são essenciais quando se busca gerar padrões de comportamento permanentes, com vistas àl; preservação e melhoria da qualidade do ambiente humano. Será necessário conduzir pesquisas e experimentos que lidem, no contexto educacional e àl; luz dos diferentes objetivos das populações, com questões relativas ao burilamento de atitudes e valores ligados ao ambiente e a seus problemas associados;

d) pesquisas relacionadas a novas estratégias para a transmissão de mensagens, visando ao desenvolvimento de conscientização ambiental, educação e formação. Diante da limitação de recursos disponíveis para a educação ambiental, tornamse indispensáveis as pesquisas e experiências destinadas a definir as estratégias mais eficazes para transmissão das mensagens educativas, novos enfoques para a formação de pessoal e utilização de novas tecnologias da informação e comunicação (teleprocessamento, vídeo etc.);

e) pesquisas sobre avaliação comparada nos diferentes componentes do processo educacional. Freqüentemente descuidada, a avaliação em educação ambiental deverá ser pesquisada de modo a se estabelecer a real efetividade do processo, visando àl; execução dos ajustes necessários para a sua melhoria.

Os métodos de avaliação que utilizam a simulação dos problemas ambientais parecem ser os mais adequados. Similarmente, também é essencial a pesquisa sobre as vantagens e desvantagens de diferentes estratégias, velhas ou novas, concebidas para a organização e transmissão das mensagens educativas.

Uma área adicional para pesquisa deveria abordar conhecimentos e atitudes relativos ao ambiente de certos grupos específicos de aprendizes, principalmente no que diz respeito ao treinamento de professores que emergem de um processo tradicional de ensino compartimentado.

PROGRAMAS EDUCACIONAIS E MATERIAIS DE ENSINO

No Congresso de Moscou (1987) chegouse àl; concordância de que a educação ambiental deveria, simultaneamente, preocuparse com a promoção da conscientização, transmissão de informações, desenvolvimento de hábitos e habilidades, promoção de valores, estabelecimento de critérios e padrões, e orientações para a resolução de problemas e tomada de decisões.

Portanto, objetivar modificações comportamentais nos campos cognitivos e afetivos. Isto necessita atividades de sala de aula e atividades de campo, com ações orientadas em projetos e em processos de participação que levem àl; autoconfiança, a atitudes positivas e ao comprometimento pessoal com a proteção ambiental implementados de modo interdisciplinar. Esta exigência requer uma reorientação do conjunto do processo educativo (conteúdo, metodologia, organização institucional, formação de pessoal).

Com o objetivo de promover a educação ambiental através do desenvolvimento de currículo e de materiais didáticos, a Conferência de Moscou estabeleceu as seguintes prioridades de ação:

a) intercâmbio de informações sobre desenvolvimento de currículo;

b) desenvolvimento de um modelo curricular (protótipo);

c) desenvolvimento de novos recursos instrucionais. Os materiais convencionais devem continuar sendo utilizados e desenvolvidos, mas há a necessidade de novos recursos capazes de organizar os conhecimentos de modo que sejam mais representativos das questões do ambiente real. Neste caso, os jogos e as simulações que tenham como tema o ambiente tornamse importantes para acentuar o papel dos conhecimentos científicos junto àl;s funções a serem desempenhadas pela tecnologia e o lugar dos valores sociais e éticos, na tomada de complexas decisões e preparação de medidas para a resolução de problemas ambientais;

d) promoção de avaliação de currículos.

TREINAMENTO DE PESSOAL

O treinamento de pessoal docente é o fator principal no desenvolvimento da educação ambiental. A aplicação de programas de educação ambiental e o próprio uso adequado de materiais de ensino só serão possíveis se os docentes tiveram acesso a treinamento, tanto em conteúdos quanto em métodos, nessa forma de educação.

Com o objetivo de promover treinamento aos docentes em serviço e aos docentes em processo de formação, encarregados da educação ambiental formal (escolar) e nãoformal (extraescolar), foram recomendadas as ações:

a) promoção de treinamento para docentes em formação.

b) promoção de treinamento para docentes em serviço.

EDUCAÇÃO TÉCNICA E VOCACIONAL

Dentre os docentes para os quais o treinamento em educação ambiental é uma prioridade, destacamse os ligados aos cursos profissionalizantes de nível médio (operários, fazendeiros etc.).

O trabalho desses profissionais geralmente produz um impacto ambiental considerável sobre os recursos naturais e, conseqüentemente, sobre a conservação do potencial produtivo dos ecossistemas naturais e antropogênicos.

Objetivando a incorporação da dimensão ambiental na educação técnica. a Conferência de Moscou indicou as seguintes ações prioritárias:

a) desenvolvimento de programas e materiais para educação e formação;

b) formação e desenvolvimento de conscientização (sensibilização) dos professores;

c) atividade prioritária para os setores de serviço. O turismo é uma das atividades no setor de serviços que, dado ao seu caráter internacional e a sua intensidade, apresenta o maior impacto sobre o ambiente. É portanto, urgente a organização do setor de modo que se consiga assegurar o crescimento dessa indústria, de forma compatível com a conservação dos recursos e das qualidades estéticas do ambiente. As suas orientações devem considerar o ambiente natural e cultural de uma dada área.

EDUCANDO E INFORMANDO O PúBLICO

A Conferência de Tbilisi deixou orientações para a estratégia educação e informação para o público ao acentuar que há uma necessidade de programas de educação ambiental que promovam a sensibilização do mesmo, em relação ao seu próprio ambiente, envolvendoo na resolução dos problemas da sociedade.

Os meios de comunicação de massa desempenham um papel importante na promoção da educação ambiental, pois constituem o meio ideal para atingir a maior audiência possível. Apesar dos resultados já atingidos por esse meio, alguns países ainda não alcançaram os objetivos de criação de uma massa de cultura genuína com respeito ao ambiente, ou seja, uma cultura que seja dividida por todos os setores da população e pela maioria das nações.

Para tornar mais efetiva a educação e a informação nessa área, a Conferência de Moscou instruiu as seguintes ações:

a) elaboração de programas educativos relativos aos meios de comunicação, essenciais para desenvolver nos indivíduos uma maior capacidade para analisar e avaliar a natureza, os objetivos e propósitos das informações. Ao mesmo tempo será necessário melhorar a qualidade das mensagens que dependem, em grande parte, do conhecimento e grau de sensibilização do comunicador, e promover a cooperação entre cientistas e comunicadores;

b) utilização dos novos meios de comunicação e dos métodos pedagógicos ativos;

c) criação de um banco de programas audiovisuais;

d) desenvolvimento e uso de museus. Museus regionais, museus de história natural e ecomuseus desempenham um papel importante na integração sistemática de experiências e novos dados ambientais, na apresentação de materiais, e na educação do público, bem como dos estudantes e professores. Seu papel educacional é enriquecido com a organização de exibições especiais, cursos e excursões, enfatizando as condições ambientais globais, regionais e locais.

EDUCAÇÃO UNIVERSITÁRIA GERAL

Em Tbilisi foi acentuado que a educação ambiental seria necessária para estudantes de todos os campos, não apenas das ciências técnicas e naturais, mas também sociais e artísticas, dada as relações entre a natureza, a tecnologia e a sociedade, que determinam o desenvolvimento desta.

Em Moscou, buscandose a incorporação mais efetiva da dimensão ambiental na educação universitária, foram estabelecidas as seguintes prioridades de ação:

a) desenvolvimento de sensibilização para as autoridades acadêmicas;

b) desenvolvimento de programas de estudo;

c) treinamento de professores;

d) cooperação institucional.

TREINAMENTO DE ESPECIALISTAS

Os programas de treinamento especializado, nas várias disciplinas ligadas ao ambiente, são considerados de alta prioridade na promoção da conscientização sobre os problemas ambientais ligados ao futuro da humanidade.

É necessário que no treinamento dos especialistas sejam enfatizadas as relações entre desenvolvimento e ambiente, de modo que lhes permitam entender o impacto das atividades humanas sobre o ambiente e contribuir efetivamente para a implementação de programas de desenvolvimento capazes de manter o equilíbrio ambiental.

Com o objetivo de promover o conceito de desenvolvimento sustentável que permite a satisfação das necessidades atuais enquanto preserva a qualidade e o potencial produtivo do ambiente, garantindo a satisfação das necessidades das gerações futuras. Neste sentido, foram estabelecidas as seguintes prioridades:

a) treinamento para especialistas ambientais;

b) treinamento para profissionais;

c) treinamento através da pesquisa;

d) desenvolvimento de programas de estudos específicos;

e) utilização das unidades de conservação;

f) fortalecimento da capacidade regional de treinamento.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E REGIONAL

Nesta área foram sugeridas as seguintes atividades prioritárias:

a) troca de informações;

b) promoção de pesquisa e experimentação;

c) promoção de treinamento;

d) programas de estudo;

e) informações sobre legislação ambiental;

f) ação regional com o marco do PIEA;

g) mobilização de recursos técnicos e financeiros;

h) coordenação e consultoria interinstitucional em âmbito internacional

CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TREINAMENTO

Considerando que o desenvolvimento da educação ambiental e formação ambiental são processos longos e que os problemas educacionais, ambientais e de desenvolvimento se modificarão na década de 90, o Congresso de Moscou sugeriu a realização de outro congresso internacional sobre educação ambiental e formação ambiental em 1997, para avaliar os progressos alcançados e estabelecer, em função das necessidades, as prioridades e os meios para o plano de ação da educação ambiental e formação ambiental; para a primeira década do século XXI·

O Congresso de Moscou, em última instância, corroborou as recomendações sobre os objetivos e princípios orientadores da educação ambiental da Conferência de Tbilisi, considerandoas como alicerces prática e o desenvolvimento de educação ambiental em todos os níveis.

Depois de Moscou, a Conferência de Tbilisi consagrouse definitivamente como o marco mais importante da educação ambiental, deixando os seus críticos de plantão em uma situação difícil, pois previam alterações profundas em suas orientações, o que terminou não ocorrendo.


(1) Atualmente o jornal Connect tem uma tiragem trimestral de treze mil exemplares, em seis idiomas, distribuído gratuitamente. Tem sido o meio mais efetivo de divulgação de informações sobre EA, em âmbito internacional. Podese adquirilo escrevendo para: Connect, 7, Place de Fonrenoy 75700, Paris, France, especificando a língua Contacto, se em espanhol; Connexion, se em francês; Connect, se em inglês e o seu ramo de atividade. Ressaltamos ainda que o Connect é impresso em papel reciclado.

Do livro - "Educação Ambiental Princípios e Práticas",
de Genebaldo Freire Dias, 2ª Ed. Editora Gaia. SP - SP. 1993.

Fonte: Ministério do Meio Ambiente

 

 

inicio desta página

 

VOLTAR