MEMÓRIAS
DO LIXO
A Terra, no limiar dos tempos em que ficou pronta e apta
para receber a raça humana, era o próprio paraíso. A natureza,
pródiga, sempre produziu em abundância o necessário para o
homem que a explorava de forma racional e não predatória, mantendo
o equilíbrio ecológico.
Evidentemente, o volume populacional
era ainda pequeno, mas o ser humano vivia em harmonia com os entes da natureza
e, ainda mais, orientar-se pela voz de sua alma, de seu coração
e não somente pelo raciocínio e pela ganância...
O
termo "ecologia" foi criado pelo biólogo alemão Ernst
Haeckel, em 1886, que a definiu como sendo o estudo do inter-retrorelacionamento
de todos os sistemas vivos e não-vivos entre si e com seu meio ambiente.
Desse modo, conclui-se que, com o aumento da população e com a revolução
industrial, já no século XIX teve início a preocupação
com o meio ambiente.
Mas foi no século XX que os resíduos
industriais e dejetos humanos na contaminação do meio ambiente cresceram
assustadoramente. E a tendência é piorar a cada dia, se não
houver medidas coercitivas, regulamentos severos e soluções adequadas.
A questão do lixo - quer seja industrial, residencial ou hospitalar - sempre
foi e será um assunto de suma importância, tendo em vista os transtornos
ou, mais que isso, um verdadeiro estrago, desastre mesmo, que ocasiona ao meio
ambiente.
O progresso, fator de suma importância no desenvolvimento
humano, se de um lado proporciona ao homem conforto e segurança; do outro
traz problemas de ordem ambiental.
Creio que o maior vilão dessa história
seja, em primeiro lugar, a indústria, seguida de perto por nós homens,
atualmente chamados de consumidores.
Analisemos os fatos: não faz
muitos anos, não existia no mercado essa gama enorme de produtos hoje conhecidos,
os quais utilizam embalagens cada vez mais modernas e sofisticadas, porém,
poluentes. Os mais velhos devem lembrar-se dos litros de leite, o qual era contido
em garrafas de vidro reutilizáveis, e dos biscoitos que vinham em latas
de vinte litros e eram vendidos a granel.
Mais recentemente, as garrafas
de refrigerantes e cervejas não eram descartáveis, nem havia esta
enorme variedade de produtos, tais como iogurtes, sucos, bem como uma gama enorme
de muitos outros, inclusive de limpeza.
Se de um lado tínhamos
o problema da higiene, ou seja, a necessidade de se lavar adequadamente as embalagens
reutilizáveis a fim de que não transmitissem doenças, havia
também o problema do espaço físico para sua guarda e ainda
um certo perigo de quebra e ferimento, bem como, antes da troca, infestação
por formigas e baratas nos recipientes, quase sempre contendo resíduos
dos produtos.
Pagamos um preço enorme pelo progresso, o qual nos
traz este ônus, pois a embalagem, um bem indispensável - pois protege,
informa e promove o produto -, após o uso, transforma-se em lixo, e como
tal também num problema.
Sabe-se que os maiores poluidores sempre
foram as indústrias, as quais lançam seus detritos industriais aos
rios (visando, acima de qualquer coisa, o lucro) e o homem, lançando seus
esgotos, ambos sem o tratamento adequado.
Esta é, em curto prazo,
a maneira mais fácil de usufruir as benesses proporcionadas pelo Planeta
Terra, o qual tudo dá sem nada receber em troca e, por isso, vinga-se dos
seus devastadores, independente de raça, cor, língua ou religião.
Planeta Terra - vivemos nele, vivemos com ele, mas precisamos também viver
por ele, viver para ele, pois esta é a nossa casa planetária. Da
mesma forma que cuidamos de nossa casa para nosso conforto pessoal e ainda receber
os amigos, conhecidos, filhos e netos, assim também devemos cuidar para
que nosso planeta tenha condições de abrigar confortável
e seguramente as próximas gerações, nossos descendentes.
O francês Lavoisier, sabiamente, disse que nada se cria, nada se perde,
tudo se transforma. Só que nesta luta injusta, o meio ambiente é
perdedor, pois diante da alta tecnologia industrial, que lança centenas
de milhares de produtos por minuto, a Natureza demora meses, anos ou até
milênios para decompô-los.
Sabemos muito bem do tempo que
necessário para que os produtos se biodegradem. Alguns, como o vidro, por
exemplo, demoram dois ou três milênios, outros, como o lixo atômico,
jamais irão degradar-se e seu acúmulo poderá trazer conseqüências
terríveis, imprevisíveis e até mesmo irreversíveis.
Mesmo ainda que de maneira um tanto tímida, tais como coleta seletiva e
reciclagem, estamos despertando para os danos da poluição, mas torna-se
necessário total envolvimento, cooperação, responsabilidade
e integração da população, a qual deve estar constantemente
sendo sensibilizada e conscientizada pelos meio de comunicação.
Se traçarmos um paralelo considerando o crescimento da população
e o crescimento das quantidades de lixo produzido, iremos ver que enquanto a população
cresce em progressão aritmética, o lixo cresce em progressão
geométrica.
Dados atuais informam que o Brasil produz atualmente
241.614 toneladas de lixo por dia, ou seja, quase quilo e meio por habitante por
dia. Mas se levarmos em conta que a coleta só é feita nos aglomerados
urbanos essa média, evidentemente, aumenta. No ano, o lixo coletado dá
um volume astronômico e altamente preocupante de 88 milhões de toneladas
(é lixo que não acaba mais), dos quais, revelam estes mesmos estudos,
76% são depositados a céu aberto em lixões, 13% são
depositados em aterros controlados, 10% em usinas e 0,1% são incinerados,
sendo então reciclados os insignificantes, 0,9% restantes.
Temos,
pois que dar todo apoio à reciclagem, pois isso irá diminuir os
custos com aterros sanitários e incineradores bem como a recuperação
das áreas degradadas pelos lixões, minimizando ainda as despesas
na compra de matérias-primas, gerando ainda renda e benefícios sociais.
Bem disse Leonardo Boff: "o bem-estar não pode ser apenas social,
mas tem de ser também sócio-cósmico. Ele tem que atender
aos demais seres da natureza, como as águas, as plantas, os animais, os
microorganismos, pois todos juntos constituem a comunidade planetária,
na qual estamos inseridos e sem os quais nós mesmos não viveríamos".
Apesar de tudo, na opinião do poeta libanês Khalil Gibran "A
Terra ama a raça humana, pois ela se delicia com nossos pés descalços
pisando a areia e os ventos anseiam por brincar em nossos cabelos".
E nós devemos ter a sensibilidade de corresponder a esse amor.
AUTOR
Orestes Nardelli Bonini - Itu